terça-feira, 22 de março de 2011

A Etologia como ferramenta para estudos de Psicologia

O homem tende ao conhecimento. Se fôssemos tentar nos distinguir dos outros animais esta seria, provavelmente, a maior diferença que poderíamos apontar. O ser humano sempre sentiu e sempre sentirá uma grande necessidade de procurar explicações para todos os mistérios que o rodeiam.
Essa constante busca por conhecimento vem acompanhada de uma série de consequências positivas e negativas. Positivas, pois é graças a essa “obsessão” que pudemos avançar tanto tecnologicamente, intelectualmente e socialmente. No entanto, tão relevante quanto os benefícios, é o aspecto negativo: a arrogância que se consolidou tão firmemente em nossas mentes.
Acreditamos que somos melhores e mais importantes que todos os outros animais que populam a Terra. Por muitas vezes, inclusive, esquecemos que somos, também, animais e que muitos de nossos comportamentos não só se repetem entre outras espécies, como se originaram nelas.
O comportamento pode ser definido como a “modificação do organismo do animal em reação ao meio interno ou externo” (Marta Fischer). É alvo de estudo de muitas áreas que o abordam sob vários pontos de vistas diferentes tais como, social, humano, animal, etc.
A ciência que estuda o comportamento animal, tendo como preocupação básica a evolução do comportamento através do processo de seleção natural é a Etologia.
A Etologia se sustenta na busca de respostas para cinco importantes questões sobre o comportamento:
1.      Qual a sua causa?
2.      Qual a sua função?
3.      Como se desenvolve o padrão comportamental?
4.      Como evoluiu?
5.      E quanto pode modificar-se no decorrer da vida?
Essa área é de grande importância para a Psicologia, uma vez que se acredita que
 “muitos princípios psicológicos aplicam-se a todos os animais, incluindo as pessoas” (Burghardt, 1985). Adiante iremos citar e comentar criticamente algumas aplicações metodológicas e práticas da Etologia na Psicologia.
            O papel desenvolvido pelo estudo do comportamento animal a partir da perspectiva evolucionária tem sido extremamente relevante para questionamentos sobre todos os estágios da vida, desde a determinação do sexo de um bebê, passando também, por pontos como a interação mãe/bebê recém-nascido, o pós parto, a sexualidade, entre outros.
            Hoje já temos técnicas que nos permitem determinar com exatidão se um bebê será do sexo masculino ou feminino. No entanto, a natureza também tem sua maneira de fazer isso. Sabe-se que o óvulo é que determina qual o espermatozóide será escolhido baseado na quantidade de energia que aquele tem. O espermatozóide mais forte, aquele que carrega o cromossomo Y, é o mais adequado para óvulos com muita energia gerando, portanto, descendentes do sexo masculino. Já o que carrega o cromossomo X é mais fraco e fecundaria óvulos com menos energia resultando em descendentes femininos.
            No mundo animal, essa fórmula é especialmente importante para animais territoriais e já foi comprovada para cervos, por exemplo (Marta Fischer). Se a fêmea for frágil e não puder prover um bom território é mais interessante gerir uma menina, que não precisará lutar tanto para sobreviver como um macho, uma vez que sempre terá parceiros para copular com ela, garantido a perpetuação da espécie.
            A questão energética está diretamente ligada à alimentação. No ser humano, homens com menos energia nas células (alimentação menos calórica) produzem espermatozóides mais fortes que irão fecundar os óvulos mais energéticos de mulheres com menos energia nas células, gerando meninos. Por outro lado, os com mais energia celular (alimentação mais calórica) produzem espermatozóides mais fracos que irão fecundar os óvulos menos energéticos de mulheres com mais energia celular, gerando meninas. Isso explica por que, por exemplo, “nas regiões brasileiras onde, normalmente, os habitantes exageram na alimentação muito calórica nascem mais meninas que meninos” (Marta Fischer).
            No caso da interação mãe/bebê observou-se que estudos feitos com animais são de grande contribuição para as relações iniciais entre recém nascidos e seus pais. Por exemplo, tanto nos ratos como nos seres humanos o contato físico e estímulos auditivos (o choro para bebês e vocalizações ultrasônicas para filhotes de ratos) são importantes ferramentas para fortalecer essa interação. Graças a estudos assim pôde-se instaurar uma importante mudança na rotina de hospitais de modo a valorizar o contato físico inicial entre bebês e seus pais.
            Não é raro observar a rejeição dos filhotes por parte das mães nas mais variadas espécies animais. Os principais motivos para isso são medo ou inexperiência no momento do parto, presença de animais estranhos, desequilíbrio nutricional da mãe, má-formação do feto, etc.
            Esse comportamento também é muito comum entre humanos, tendo como exemplo mais conhecido a Depressão Pós Parto (DPP). Um estudo de Edward Hagen da Universidade de Califórnia aponta que a DPP pode ser um dispositivo evolutivo de uma mãe que não teve apoio paternal ou social ou que teve indicadores de problemas de saúde do bebê e, como conseqüência, reduz o “investimento” na cria.
            Assim como os outros animais têm que decidir, em dado momento, se é mais interessante investir energia em uma cria, em procurar parceiros ou neles próprios, as mães humanas que considerarem esse investimento pouco benéfico podem acabar desenvolvendo a DPP como uma maneira de se adaptar a uma situação adversa ou de “negociar” um investimento maior por parte de outros.
            Outro fenômeno muito interessante na natureza é o da Estampagem. Ele pode ser definido como a aquisição de comportamentos ou idéias devido a uma exposição constante nos estágios iniciais da vida, especialmente no estágio que o etologista Konrad Lorenz definiu como “período crítico”. Um exemplo são as aves que deixam o ninho logo após saírem de seus ovos e que copiam os movimentos que seus pais fazem seguindo-os por todos os lugares.
            Esse fenômeno também é observado nos bebês humanos que aprendem a distinguir quem é o pai e quem é a mãe já dentro do útero, uma vez que bebês já são capazes de ouvir nossas vozes antes mesmo de nascerem.
            A sexualidade é um tema largamente explorado pela etologia com inúmeras aplicações na Psicologia. Entender alguns comportamentos humanos referentes a esse assunto se tornou muito mais fácil depois que teorias evolucionistas começaram a ser aplicadas para desvendar os mistérios que circundam esse tópico.
            A Estampagem citada anteriormente também contribuiu para tentarmos entender comportamentos como os fetiches. Nos períodos críticos do início da vida a estampagem sexual é o que ensina um animal jovem as características de um parceiro desejável. Se objetos como um sapato forem “estampados” isso poderia justificar como fetiches em sapatos, se desenvolvem, por exemplo.
            Através de tantos exemplos fica evidente a importância da Etologia e suas derivações para a melhor compreensão do ser humano como um ser biopsicossocial. As idéias de que conseguimos dominar as ciências humanas e de que estamos em oposição a esta tem se provado cada vez mais equivocadas graças a avanços dessa ciência e suas implicações em outras áreas do saber, como a Psicologia.
            O fato de termos semelhanças com outras espécies não nos torna inferiores ou tampouco, menos importantes. Simplesmente, realça a importância e atenção que temos que dar para as outras espécies como seres que dividem conosco a mesma biosfera e que podem ter mais em comum conosco do que imaginamos.

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