Resiliência é um termo cunhado
na Física e relaciona-se à propriedade dos materiais de não sofrerem ruptura ao
serem submetidos à tensão, podendo ou não ficar deformados após o cessar desta
tensão. Resiliência é também a palavra que pode definir a história de Claireece
Precious Jones, ou apenas Precious.
Em seus 16 anos, Precious possui
imaginação muito fértil e criativa, sofre de obesidade mórbida, tem grandes
dificuldades na escola por ser analfabeta funcional, acabando por ser expulsa
da mesma ao ser constatado que está grávida pela segunda vez. O pai deste bebê
expõe o cenário coercitivo ao qual a jovem é exposta diariamente desde sua
infância. O pai da personagem principal abusa sexualmente, fisicamente e
psicologicamente da filha desde os três anos de idade sendo então o responsável
pelas gravidezes da mesma.
A mãe, Mary, vive dos benefícios
que o Estado paga à Precious por sua primeira filha, portadora de Síndrome de
Down. Frente aos abusos cometidos por seu marido, Mary esquiva da realidade e
alimenta um ciúme intenso pela filha, vendo-a como rival, contribuindo para o
sofrimento da adolescente negligenciando-a e abusando-a psicologicamente.
Em tal cenário, com estilos
parentais extremamente negativos, sem a sustentação educacional necessária e
tendo sido exposta a pouquíssimos modelos, com exceção de sua avó materna, de
habilidades sociais, restam à Precious suas duas válvulas de escape: a comida e
sua imaginação. A primeira lhe traz sérios prejuízos externalizados em sua
obesidade mórbida. A segunda, entretanto, pode ter sido um dos principais
fatores de resiliência frente a tantas adversidades.
Há, no entanto, outro importante
fator que contribuiu para que a jovem Precious não sofresse ruptura com toda a
tensão a que estava submetida. Ao ser expulsa da escola por estar grávida, a
mesma foi direcionada a uma escola de ensino diferenciado para garotas com
problemas sociais. Nesta escola ela conhece Ms. Blu Rain, professora que,
através de sua interação atenciosa e solícita com seus alunos, em especial com
a adolescente, mostra-lhe novas maneiras de enfrentar suas adversidades agora
agravadas pelo fato de que ao sair da escola regular pararia de receber os
benefícios do Estado, fazendo com que sua mãe a trate de maneira ainda mais
violenta.
Precious, no entanto, demonstra
mais uma vez sua grande resiliência e não abandona a escola especial o que lhe
propicia o aprendizado de novas habilidades sociais, além de aprender a ler e a
escrever. Em visita ao Serviço Social revela a verdade sobre os abusos que
sofre em casa, o que acarreta na interrupção dos benefícios. Pouco tempo
depois, nasce o segundo filho, Abdul, e após o período de internação no
hospital, a adolescente volta para casa onde sua mãe a hostiliza e derruba o
recém-nascido bebê o que faz com que a jovem fuja da casa e procure a ajuda da
professora, Ms. Rain que a acolhe em sua casa até achar um local para a mesma
ficar.
A protagonista, agora em uma
casa de passagem, recebe uma visita de sua mãe que lhe conta que seu marido
faleceu de AIDS, o que assusta Precious fazendo com que busque fazer o teste e
descubra que é portadora do vírus, mas seu filho não. Na etapa final do filme,
a jovem está no Serviço Social com sua mãe que diz à assistente social que
deseja ser uma família com Precious e suas netas.
Em uma última demonstração da
incrível resiliência fortalecida pelas novas relações sociais, novas
experiências que viveu e pela confiança melhorada após criação de vínculos
saudáveis e desenvolvimento de suas habilidades escolares, a protagonista pega
seu bebê e sua primeira filha e vai embora dizendo à mãe que nunca mais a verá.
Impressionante como é a
demonstração de resiliência apresentada pela personagem neste filme, raras são
as situações em que há um final feliz para crianças criadas em ambientes tão
aversivos quanto o apresentado no filme. O filme choca por mostrar, sem muito
pudor, a brutalidade de pais abusadores e negligentes e as consequências que
tais estilos parentais podem ter nos filhos como o comer compulsivo,
autodepreciação, fugas da realidade, agressividade, entre outros
comportamentos.
O filme nos faz refletir sobre o
papel da família, do Estado e das relações sociais para que o desenvolvimento
de um indivíduo possa se dar levando em consideração o bio, o psico e o social.
Além disso, nos convida a uma reflexão a respeito de como um problema social
reflete práticas culturais coercitivas as quais todos compartilham parcela de
responsabilidade a respeito.
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