Ontem à noite, em um momento de descontração na internet, deparei-me com uma imagem na qual um indivíduo perguntava, no site Yahoo Answers, como poderia contratar o Youtube para filmar sua festa de noivado. Ao compartilhar a imagem com meus contatos do Facebook, uma de minhas amigas comentou demonstrando desagrado com o fato de estarem achando engraçada a gafe cometida e que ninguém nasce sabendo tudo.
Após ter passado o dia estudando filósofos como Kant, Rousseau, Sartre e Adorno, foi inevitável não associar alguns dos ideais defendidos por estes pensadores à uma situação que, em primeira instância, não parecia passível de tamanha reflexão. Admirei-me, ao perceber que fizera o que um texto que li pela tarde pedia a seus leitores: olhei para a realidade de maneira diferente, espantei-me com o que parecia óbvio.
Comecemos falando de Adorno e Horkheimer e a Escola de Frankfurt, que muito debateram sobre o acesso da massa à cultura e o impacto da industrialização da mesma em nosso dia-a-dia. Ora, por mais que não se concorde com uma elitização da cultura e da informação; um acesso desordenado e descontrolado tende apenas a promoção e fomento de cenários como o ocorrido no site de perguntas. A internet, assim como qualquer outro meio de comunicação, nos bombardeia intensamente com propagandas imediatistas como "Compre! Faça! Busque Aqui! Imperdível!", nos dizendo o que fazer e como fazer. Buscam-se cada vez mais respostas prontas que pouca reflexão a respeito demandam.
A partir disto, fui levado imediatamente ao estado de menoridade apontado por Kant. Estado este, que é definido pelo comodismo e o hábito vicioso que, frequentemente, fazem com que as pessoas prefiram ir imediatamente a uma fonte de respostas prontas e imediatas ao invés de se esforçarem para conhecer e entender melhor o funcionamento daquilo que lhes é desconhecido. Não existe aprendizado sem questionamento, isto é indiscutível. No entanto, o questionamento, pela preguiça de aprender, somente nos afunda cada vez mais na referida menoridade.
Não pude deixar também de, a partir da diferença entre minha opinião e a daquela que criticou a imagem, contrastar o essencialismo - presente na ideologia de Rousseau, que acreditava que o homem nascia com uma essência boa e sua existência na sociedade é que o corrompia - com o existencialismo, de Sartre, que defendia que o homem nasce sem essência e esta vai se construindo a partir de sua existência, de suas escolhas e ações, pelas quais, assim como pelas consequências delas, é inteiramente responsável.
O ponto de maior debate foi a responsabilidade da gafe cometida. De um lado, a falha era aceitável, afinal ninguém tem a obrigação de saber tudo - o que me remeteu ao essencialismo, pois não consegui desassociar essa noção da visão essencialista de que nossas ações são reflexo de algo pré-determinado - e de outro, o que defendi, que ao escolher se lançar à internet visando apenas uma resposta pronta, a respeito de algo para o qual nenhum interesse prévio aparente foi dirigido, o indivíduo estava apenas reforçando seu estado de menoridade e, era sim, responsável por sua gafe. Por mais que expor a situação de maneira jocosa não seja uma solução para o problema, era uma consequência a ser prevista ao ser tomada a decisão de se fazer a pergunta.
O resultado da discussão? Cada um continuou com sua opinião. No entanto, ao fim da reflexão, lembrei-me novamente daquele texto que me pedia para lançar um olhar diferente à realidade. Lembrei-me que o mesmo texto afirmava que, embora esta empreitada seja árdua e cheia de conflitos, os horizontes que se desvendam são repletos de novas possibilidades; possibilidades de mudanças e transformações tanto interna, como externamente.